Introdução à Cultura Data-Driven

Você deve estar imaginando; “Lá vou eu mergulhar no universo de mais uma Buzzword”. Não é mesmo? Porém, se chegou até aqui, é porque a curiosidade foi maior do que o pré-conceito. O que já é um grande passo. Pois, significa que você está buscando informações e referências para construir seu próprio entendimento e opinião sobre o tema. E este comportamento tem muito mais a ver com a cultura Data Driven do que você imagina. Ao menos até agora. E não sou eu quem estou dizendo isso. Este seu comportamento se encaixa na definição simplificada de Neil Patel, um dos 10 melhores profissionais de marketing do mundo, segundo a Forbes, e eleito um dos maiores influenciadores da Internet pelo Wall Street Journal. Patel, diz que:

Ser Data Driven significa ter uma base sólida para tomar decisões, ao invés de partir para suposições. E essa base é formada por um conjunto interligado de dados que podem ser coletados, tratados e interpretados para gerar visões mais claras para a tomada de decisão.”

Neil Patel

Logo, ainda segundo Neil Patel, “Data Driven é muito mais do que uma buzzword. É o futuro dos negócios orientados a dados.” Isto porque já vivemos em um mundo com abundância de dados. Não é a toa que redes sociais conseguem prever a mudança do seu status de relacionamento, com meses de antecedência, por exemplo. Neste mundo hiperconectado, quase tudo passa a ser neuroticamente mensurável. Para termos uma ideia, conforme levantado pela empresa DOMO na 8ª edição do seu já famoso e aguardado estudo anual, DATA NEVER SLEEP, a quantidade de dados gerados nos últimos 2 anos é maior do que a quantidade já produzida na história da humanidade. Para cada indivíduo do planeta, gera-se em média 1,7 Megabyte de dados por segundo. E muito disso se dá pela crescente e acelerada adoção de dispositivos de IoT (Internet Of Thinks) e ao crescimento do número de pessoas com acesso à Internet, que já passou de 4,54 bilhões de usuários. O equivalente a 59% da população global. Sendo ainda que já são 5,19 bilhões de dispositivos móveis ativos no mundo e 3,8 bilhões de usuários de redes sociais. O que significa 67% e 49% da população mundial, respectivamente. Logo, não é difícil de compreender que sistemas, empresas e redes sociais possam saber mais a nosso respeito do que nós mesmos. Lembram do famoso caso das lojas TARGET que muito antes de dispor de plataformas de inteligência artificial já conseguiu prever a gravidez de uma cliente apenas pela mudança de seu comportamento de compra e antecipar ofertas para o bebê, antes mesmo dele nascer.

Pela primeira vez na história, temos concorrência para o autoconhecimento.”

Yuval Harari
“Data Never Sleep 8.0” – Levantamento de dados realizado pela Domo.com

Mas afinal, o que é na prática esta cultura Data Driven?

Uma cultura é algo baseado em um conjunto de convenções, valores e rituais. Sendo assim, uma cultura dirigida por dados ocorre quando existe práticas institucionalidades de se levantar dados, certificar de que estes dados estejam corretos e tenham um grau de prescrição aceitável em sua coleta para serem tabulados e carregados para análises que possam apontar, destacar e até mesmo antecipar determinadas situações. Seja para informar e reportar resultados para tomadas de decisões humanas ou até mesmo em casos mais avançados servirem de gatilho para ações prescritivas. Eliminando ao máximo que opiniões, pré-conceitos ou preferências pessoais sejam os balizadores na escolha de um layout para o site, uma paleta de cores selecionada para a composição de um produto, funcionalidades atribuídas em um software ou mesmo a decisão de que locais abrir novas lojas e centros de distribuições ou qual deve ser a linguagem dos anúncios a serem veiculados em que canais de comunicação, e assim por diante.

É um erro capital teorizar antes que se tenha dados. Insensivelmente, começa-se a distorcer fatos para se adequarem a teorias em vez de se criar teorias que se adequem aos fatos.”

Sherlock Holmes.

Portanto, é importante que as pessoas e as empresas dispostas a construírem esta cultura, passem a considerar mudanças de hábitos, a instauração de processos de checagem e validação e dentro do possível, construir bases unificadas da dados. Mais importante do que criar um grande e moderno data wherehouse, é despertar nas pessoas a consciência e a percepção de valor no que os dados são capazes de entregar como resultados e como insights. E está justamente neste ponto, no incentivo e na consciência das pessoas, a maior resistência encontrada pelas empresas na hora de desenvolver uma cultura orientada a dados. Pois apesar de 92% das empresas que participaram de um estudo realizado em 2019 pela Business Application Research Center (BARC), acreditarem que é importante que seus colaboradores sejam alfabetizados em dados, apenas 17% delas relatam que de fato incentivam que seus profissionais se tornem mais confiantes com o emprego dos dados. Este é um processo que leva tempo e não ocorre da noite para o dia. É preciso sensibilizar e capacitar a equipe inteira, criar processos acessíveis e bem disseminados para o alcance, conhecimento e adesão de todos. Além de oferecer ferramentas e fomentar situações propícias para que a prática possa começar a acontecer e os rituais possam ser instituídos de acordo com a personalidade e cultura da empresa.

“Em 2020, 80% das organizações iniciaram o desenvolvimento deliberado de competências no campo da alfabetização em dados, reconhecendo sua extrema deficiência.”

Gartner

É possível obter vantagem competitiva com uma cultura Data Driven?

As respostas são mensuradas com dados. Um estudo realizado em 2019 pelo Valor Invest aponta que 75% das empresas registraram aumento das vendas depois que a área comercial se digitalizou e passou a usar dados para orientar seu trabalho de prospecção. E 67% das que adotam tecnologias digitais para prospectar clientes relatam aumento significativo no faturamento após o primeiro ano de operação com estas ferramentas. Além da redução de tempo gasto com atividades operacionais por 32% das empresas respondentes. Um exemplo prático de como utilizar dados para guiar o trabalho de comunicação e prospecção de novos clientes é empregar ferramentas que permitam utilizar a base atual de clientes como referência para se traçar modelos estatísticos que apontem as principais características dos melhores clientes e auxilie a mapear no mercado onde existe uma maior incidência de empresas ou consumidores com este perfil. Seja na seleção de cidades onde haja um maior número de empresas com as mesmas atividades comerciais, faturamento, número de colaboradores, número de veículos e etc, para se determinar praças alvos de campanhas de marketing e ações de outbound direto da equipe comercial. Como também na identificação do perfil de consumo de consumidores de uma loja de roupas com base nas variáveis comportamentais e demográficos de cada cliente, como a recência da última compra, distância em que reside em relação á loja, estado civil, categoria de produtos que compra. Estes são conjuntos de dados que podem apontar quais clientes são mais propensos a elevarem o seu ticket médio de compra mediante a novos estímulos de descontos, anúncios ou mesmo experimentação.

Principais elementos de uma cultura Data Driven

Pessoas: As empresas irão precisar de profissionais que entendam de dados, que saibam trabalhar com dados em seu cotidiano e que atuem de forma responsável diante deles, seja em questões de segurança quando na preocupação de indexação e integridade das bases de dados. Nas estruturas mais maduras, surge a figura do CDO (Chief data Officer), responsável pela gestão dos dados da organização e também, pela capacitação dos colaboradores e desenvolvimento de uma cultura ainda mais avançada no emprego dos dados.

Processos: Os processos organizacionais muitas vezes não acompanham as mudanças tecnológicas e comportamentais adotadas pela empresa e inevitavelmente precisarão se adaptar. Seja para assegurar que dados essenciais não sejam perdidos ou deixados de serem “imputados” ou garantir que dados importantes sejam validados antes de serem armazenados, como na estruturação de acessos a quem pode ou deve ter acesso a cada camada de dados e informações.

Dados: Obviamente os próprios dados são peças-chaves de toda estrutura cultural orientada a dados. O que torna imprescindível rotinas de segurança e de higienização dos dados de modo que possam sempre oferecer as melhores condições de manuseio, análise e resultados.

Tecnologias: Não é fácil fugir das tecnologias que potencializam a coleta, validação, tabulação, armazenagem, análise e carregamento dos dados. Até mesmo de automações que tornem as ações preditivas e preventivas possíveis. Cabendo à gestão o dimensionamento dos investimentos de acordo com a maturidade do negócio, do desenvolvimento desta cultura Data Driven, do volume dos dados e principalmente da sua criticidade para a operação e estratégia do negócio.

Apresento aqui 7 dicas importantes para auxiliar você, gestor que quer transformar sua empresa e pavimentar o caminho para uma cultura Data Driven. São elas:

1 – Defina um objetivo claro e o compartilhe com todos.
2 – Identifique as pessoas e áreas chaves que precisarão ser mais participativas ou que poderão melhor contribuir com o processo e estimular outros a aderirem à jornada.
3 – Comece a coletar e a analisar os dados necessários.
4 – Forneça e empregue as ferramentas adequadas para que o time possa trabalhar com mais eficiência e para facilitar a redução das resistências da mudança.
6 – Crie programas de incentivo e empodere as pessoas para que os insights em ações concretas.
7 – E de modo contínuo, desde o início, se comprometa a treinar 100% da equipe.

Algumas tecnologias focadas em dados:

Business Intelligence [BI]: É o processo de extração, tabulação e carregamento de dados para monitoramento por meio de indicadores compartilhados que apontam de forma simplificada o status de determinas configurações, como volume de estoque, % da mão de obra alocada, disponibilidade de recursos eletrônicos ou resultado de vendas/pedidos em comparativo a meta do período. Estes indicadores permitem aos gestores maior ciência do estado atual da empresa para suas tomadas de decisões.

Inteligência Artificial [AI]: É a tecnóloga que possibilita rodar testes estatísticos de modo automatizado com grandes volumes de dados a cada nova atualizada de dados. Ou seja, é como se houvesse a disposição da empresa um exército de matemáticos realizando cálculos estatísticos a cada venda realizada, a cada acesso ou consulta no site, a cada cadastro de novo cliente ou registro de parada de uma máquina na linha de produção. Por isso, para se trabalhar com plataformas de inteligência artificial se faz necessário possuir uma grande base de dados dinâmica. O que chamamos de Big Data.

Biga Data: Uma grande nuvem de dados com capacidade de armazenar e interconectar dados de diferentes formatos, estruturas e origens, com grande velocidade.

Machine Learning: é a tecnologia que permite que máquinas e sistemas se alimentem de dados e com eles possam aprender, estabelecendo modelos matemáticos que sirvam de referências positivas e/ou negativas para passar a entender se algo que está acontecendo tende a ser bom ou ruim em sua tendencia de movimentos/etapas futuras.

Computação na Nuvem [Cloud Computing]: É a tecnologia que permite armazenar dados de forma remota em grandes data centers por exemplo a um custo muito mais baixo e com um nível de segurança muito mais elevado do que localmente.

Internet das Coisas [IoT]: É o que permite que diversos dispositivos como câmeras, lâmpadas, sensores, televisores, torradeiras e muito mais, se conectem à internet e possam transmitir dados e receber comandos.

Blockchain: Um sistema altamente avançado de segurança que permite o envio, recebimento e rastreio de informações em conexões Pear to Pear [P2P], ou seja, de um usuário para outro. Operando no conceito de rede, possui a validação encadeada na própria rede. Ou seja, por mais que alguém consiga quebrar a criptografia de uma chave e alterar indevidamente seus dados, a rede a recusaria, por não mais reconhecer seu conteúdo como deveria ser, pois não será possível identificar um evento homologado pela rede que tenha causado esta alteração de dados. O que torna seu sistema altamente confiável, seguro e descentralizado.

Processamento de Linguagem Natural [PNL]: Trata-se de um desdobramento da Inteligência Artificial mais profundo, capaz de interpretar e compreender os significados atribuídos aos elementos da linguagem humana, seja em formato de texto ou voz. Para isso, utiliza-se de análises sintáticas, semânticas léxicas e morfológicas, o que humaniza e facilita a interação entre homem e máquina.

Robotic Process Automation [RPA]: Esta é a tecnologia de automação de processos repetitivos que permite por exemplo que máquinas e sistemas ajam de forma ativa na prevenção de incidentes previamente identificados, substituindo a intervenção humana e/ou execução de tarefas repetitivas ou de necessidade de rápida resposta.

Por fim, listo os 4 tipos de análises de dados que determinam o estágio em que uma empresa está empregando os dados como parte de sua cultura de negócio.

1 – Análise Descritiva: Capaz de informar e descrever o que está acontecendo.

2 – Análise Exploratório: Oferece um diagnóstico do porquê algo está acontecendo.

3 – Análise Preditiva: Com base no histórico de dados e nos modelos estatísticos, permite apontar o que pode vir a acontecer. Ou seja, projeta um cenário futuro com base no comportamento dos dados.

4 – Análise Prescritiva: Este é o estágio mais avançado disponível atualmente. É o tipo de análise que oferece uma ou mais sugestões de ação. Pois com base no histórico de dados consegue avaliar quais as ações realizadas para a configuração de cenário desenhado com base no estágio anterior, de predição. Porém, já considerando a ou as melhores tratativas para a resolução de um problema.

É como a sugestão de qual peça de xadrez deve-se mover com base na análise de todas as possibilidades de jogadas futuras consideradas. E uma vez tendo esta sugestão de ação prescritiva é possível permitir que sistemas robotizados de automação [RPA] possam realizar comandos e/ou ações automáticas para executar a sugestão recebida da Inteligência Artificial que previu que um problema de mal funcionamento de uma máquina poderia ocorrer na linha de montagem de uma indústria, reduzindo sua velocidade de manutenção para evitar ou reduzir o desgaste até que uma manutenção preventiva ou corretiva possa ser acionada. Impedindo assim que a máquina quebre e ainda assim, possa continuar em operação enquanto aguarda a manutenção solicitada automaticamente.

Uma cultura Data Driven ou orientada a dados dentro de uma organização não é algo que se faz sozinho e sim de forma coletiva e colaborativa. Sendo assim, trata-se de um mindset coletivo que permite e estimula com que cada integrante esteja atendo, vigilante, responsável e participativo no registro, na preservação e no compartilhamento dos dados. Mas, principalmente na sua utilização com o compromisso de obter o melhor resultado de modo efetivo. A transformação digital está cada vez mais presente e relevante no mundo dos negócios e acompanhá-la se torna imperativo para a sobrevivência de qualquer modelo de negócio. Evidente que alguns modelos são pressionados com uma urgência maior enquanto outros ainda assistem as mudanças ocorrerem mais lentas em seus mercados. Mas uma coisa é certa. A transformação digital irá reconfigurar o seu mercado e você será forçado a mudar, estando pronto para isso ou não. E neste momento, quem estiver mais munido de informações e já estiver habituado a se guiar por dados, vai ter maior tranquilidade e clarividência em suas decisões. Em outras palavras; aquela já venha promessa de que os dados teriam se tornado o novo petróleo passa aos poucos a fazer sentido diariamente para um número maior de pessoas. E para você, isso já faz sentido?

Para encerrar, gostaria de registar uma frase que venho repetindo em minhas aulas e palestras já há alguns anos;

O que eu acho e o que você acredita se toram irrelevantes quando medimos”

Alexandre Conte

Escrito por Alexandre Conte.

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